Sistema do direito, novas tecnologias, globalização e o constitucionalismo contemporâneo: desafios e perspectivas

Dominique Rousseau 186 nela, mas, sim, construída por meio da deliberação entre atores concorrentes, uma das condições necessárias à formação da vontade geral é a de se garantir o exercício das liberdades permitindo esta deliberação: liberdade de expressão, para defender os diferentes significados que um princípio constitucional pode ter, liberdade de ir e vir, para ir defender em qualquer lugar estas diferenças, direitos de defesa, para a liberdade de expressão ser protegida, liberdade de manifestação, de associação, pluralismo etc. Sem esses direitos, uns que garantem a pessoa no bojo das suas atividades privadas, e outros no bojo das suas atividades públicas, de modo que estas duas categorias de direitos se conciliam e se fortalecem reciprocamente, o princípio de deliberação seria letra morta. A deliberação só se torna um princípio ativo do regime concorrencial de enunciação da vontade geral por intermédio do direito e, em particular, destes direitos fundamentais de valor constitucional que definem o código de realização da atividade deliberativa. Resta, evidentemente, uma questão, que sempre paira: a do governo dos juízes. O fato de os juízes constitucionais intervirem, neste regime concorrencial, posicionando-se sobre se o texto aprovado pelos parlamentares merece ser qualificado como lei. Podem eles, por outro lado, recusar esta qualidade a um texto aprovado pelos eleitos do povo. Isso não equivaleria a transferir o poder normativo real dos eleitos aos juízes? Embora polêmica, esta crítica deve ser levada a sério, uma vez que coloca a reflexão diante de uma alternativa: quer o soberano é considerado capaz de produzir, diretamente e sem mediação, a vontade geral, quer o juiz é supostamente capaz de criar, discricionariamente e sem restrição, o significado da norma; ou a lei é o que o Rei – ou o Presidente, ou o Parlamento – diz que ela é, ou a lei é o que o juiz diz que ela é. Há de se sair desta alternativa simplista. A palavra do soberano apenas ganha consistência e adquire uma eficácia por meio de uma relação complexa entre esta, tal como transcrita em palavras na Constituição, e todos aqueles que fazem uso dela; é com base nesta relação, e não no gesto unilateral, voluntário e solitário de uma das partes nela envolvidas que se constrói o significado dos enunciados constitucionais e que a palavra do soberano se torna atuante. E neste jogo complexo de produção de sentidos, a jurisdição constitucional é apenas um dos atores, aquele que obriga aos demais a argumentar as suas leituras de

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