Sistema do direito, novas tecnologias, globalização e o constitucionalismo contemporâneo: desafios e perspectivas

17 Constitucionalismo transnacional e governança de crises globais reito e, por consequência, constituído com base no Direito. Em outras palavras, foram os ideais liberais presentes nas duas grandes revoluções europeias desse período (Inglaterra, em 1688; França, em 1789) e na Independência dos EUA (em 1776) que corroboraram para a construção de um modelo de Estado de Direito notadamente liberal. Maurizio Fioravanti (2007, p. 26-27) pontuou três princípios que sintetizam os nortes daquela que veio a ser chamada de constituição liberal , i.e., a constituição de um Estado liberal de Direito: (1) princípio da presunção de liberdade, segundo o qual os indivíduos são livres até que a lei determine o contrário, ou seja, aquilo que não é proibido, é permitido; (2) princípio da reserva legal, que se constitui em princípio segundo o qual somente a lei pode limitar ou disciplinar o exercício de direitos individuais; e (3) princípio da constituição como ato que garante os direitos individuais e separa os poderes, estando tal princípio na base estrutural de todas as constituições que se seguiram ao – e se inspiraram no – período de revoluções liberais. Karl Loewenstein (1976, p. 213) bem lembrava que todas as primeiras constituições modernas ocidentais eram de ideologia liberal porque “o telosdo constitucionalismo da primeira época foi a limitação do poder absoluto e a proteção dos destinatários do poder contra a arbitrariedade e falta de medida dos detentores do poder”. Já Fioravanti (1995, p. 118) destaca que, com o advento do Estado liberal de Direito, criou-se o seguinte quadro normativo: “ soberania do Estado removida das pretensões contratualistas dos indivíduos e das forças sociais, por um lado; e autonomia da sociedade civil afastada das pretensões dirigistas dos poderes públicos, por outro lado”. Consequência lógica seria o seguinte raciocínio: “se todas as liberdades se fundam somente e exclusivamente nas leis do Estado, deve-se admitir que existe entãoum único direito fundamental, o de ser tratado conforme as leis do Estado. ” (FIORAVANTI, 1995, p. 125). O esgotamento do modelo liberal em solo europeu ocasionou uma transição, ocorrida no início do séc. XX, para o Estado social de Direito. Todavia, restou, sempre conservada, a ideia de supremacia da lei na resolução dos conflitos sociais, o que implica na sua utilização como instrumento de tutela dos direitos contra o arbítrio. A lei é dotada de tão grande significância porque “é o caminho indispensável para as liberdades. O indivíduo é livre na medida em que age dentro dos limites

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