Direitos da Natureza: marcos para a construção de uma teoria geral

Chantelle da Silva Teixeira 56 pela dificuldade pública no reconhecimento dos direitos e, por outro, a intencio- nal demora e omissão do Estado no cumprimento de suas funções constitucio- nais. Em seguida, o texto se ocupa dos aspectos da sentença que, do nosso ponto de vista, deixam clara uma nova e emancipatória compressão sobre os direitos ter- ritoriais indígenas, sua maneira de se relacionar com a terra baseada na coexistên- cia e respeito mútuos e na interdependência desses sujeitos que são a natureza, a Pachamama (mãe terra em quéchua), e a espécie humana. Por fim, busca-se com o estudo realçar as construções que essa luta pode trazer ao empoderamento do debate sobre os direitos da natureza. Assim, apostamos na hipótese de estarmos diante de uma das principais jurisprudências que, para além de servir como guia na fiscalização da relação dos direitos, serve como fonte aclaradora da compreensão de que a natureza, a terra e a humanidade são interdependentes e, mais que isso, a sobrevivência de uma está condicionada à sobrevivência da outra. 4.1 MARCAS DE UM PROTAGONISMO HISTÓRICO O Povo Indígena Xukuru é constituído por aproximadamente 2.300 fa- mílias e 7.700 indígenas, distribuídos em 24 comunidades dentro do território indígena Xukuru, que possui 27.555 hectares de extensão, no município de Pes- queira, estado de Pernambuco. Também são chamados de “Xukuru de Ororubá”, em referência ao conjunto de montanhas, conhecido como Serra do Ororubá, no estado de Pernambuco, que compõe seu território. Os registros mais antigos sobre os Xukuru datam do século XVI e, desde então, indicavam que a sua ocupação nessa região já sofria transformações devi- do aos violentos processos de expropriação de suas terras. Os povos indígenas da região nordestina foram os primeiros a entrarem em contato com o colonizador, assim como foram os primeiros a sofrerem o processo de espoliação de suas ter- ras. Aldeias extintas deram lugar a fazendas devidamente registradas, que foram alguns dos resultados das invasões sistemáticas dos colonizadores. Nesse contexto, os Xukuru tiveram sua identidade étnica dissolvida junto à população local. Durante muito tempo foram considerados como remanescentes, descendentes de índios, ou chamados simplesmente de “caboclos da serra”, numa menção a Serra do Ororubá, onde habitam. Essa situação trouxe questionamentos sobre sua identidade étnica. Contudo, os Xukuru reafirmaram sua identidade étnica perante a socieda- de e, como grupo culturalmente diverso, elaboraram uma tradição própria, que ganhou notoriedade através da mobilização pela demarcação de seu território. A organização política e social dos Xukuru é resultado não apenas das rela- ções que são estabelecidas entre eles e a rede de pessoas com as quais conviveram, ao longo de sua história, mas também do seu universo simbólico. A crença na na- tureza sagrada é uma característica importante do povo Xukuru. É nos terreiros distribuídos em seu território que os rituais religiosos são realizados e constituem o espaço de contato com os caboclos e encantados. O toré se destaca nesse contex-

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