Direitos da Natureza: marcos para a construção de uma teoria geral

Vanessa Hasson de Oliveira 132 dos povos originários. É no resgate da identidade que a vida em plenitude do in- divíduo se inicia e, assim, a identificação com o território passa a ter fundamental importância. Neste sentido, a articulação que se inicia no Brasil, no âmbito do advocacy da OSCIP MAPAS 1 , sob a direção desta autora, prioriza a introdução do reconhe- cimento dos direitos da Natureza em nível local. Respeitando a lógica ancestral da identidade biocultural das comunidades em relação aos seus territórios, exercidos por meio da convivialidade, a ação se dá mediante a institucionalização 2 desta for- ma ancestral de dispor-se diante e entre os demais membros da Natureza, fazendo promulgar na Lei Orgânica dos municípios brasileiros, dispositivo normativo que declare que naquela localidade referidos direitos são expressamente reconhecidos. Este capítulo pretende oferecer, como inspiração, a forma como foram traça- dos os caminhos para o êxito desta empreitada, inclusive no que se refere à escolha, ou melhor, dizendo, à falta dela, do município de Bonito, no estado do Pernambu- co, como primeiro município a reconhecer os direitos da Natureza no Brasil. Objetivamos oferecer, em consonância à plenitude da abundância da Pa- cha , elementos sutis que possam servir de iluminação aos mais de cinco mil muni- cípios brasileiros na elaboração e/ou reavaliação de sua constituição local. Dessa maneira, o presente texto apresenta, em primeiro lugar, os marcos que sustentaram essa inciativa e, paulatinamente, estão se espalhando pelos con- textos de outros entes federativos, Paudalho/PE; Florianópolis/SC; São Paulo/SP; Palmas/TO; Fortaleza/CE; Salvador/BA. Em seguida, se ocupa o texto de uma síntese metodológica que permeou a construção dessa inclusão expressa do reconhecimento dos direitos da Natureza naquela localidade. E, por fim, de apresentar o desenrolar dessa experiência em outros municípios brasileiros com o fito de servir de apoio e incentivo para outras iniciativas legislativas e na construção dos marcos teóricos do Direito da Natureza. 10.1 FUNDAMENTOS DE UMA EXPERIÊNCIA PROMISSORA Por constituir-se desta identidade a partir da Terra e do território, mesmo ao ser humano já totalmente desconectado de suas origens, a proximidade com a terra em seu sentido material e, por desdobramento, ao sentido telúrico, é um 1 A MAPAS foi fundada em 2004 para servir de apoio às práticas ambientais e sociais empresariais e da sociedade civil em articulação com o Poder Público. Reconhecida como OSCIP logo após sua fundação, a partir de 2014, sob a direção desta autora inicia intensivamente ações de advoca- cy , realizando campanhas, coordenando e participando de fóruns de debates e articulando a pro- mulgação de legislação em respeito aos direitos da Natureza. Para maiores informações consulte o website da organização: http://www.mapas.org.br . 2 “Certamente, há que se destacar todas as contribuições e as lutas do mundo indígena, onde a Pa- cha Mama é parte consubstancial da vida. Em seu mundo, reconhecimento legal de tais direitos não é necessário. Na civilização ocidental, sim, para que se possa reorganizar a vida dos seres humanos entre si e com a Natureza.” ACOSTA, Alberto. O bem viver : uma oportunidade para imaginar outros mundos; tradução de Tadeu Breda. São Paulo: Autonomia Literária; Elefante, 2016. p. 125.

RkJQdWJsaXNoZXIy MjEzNzYz