A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

94 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica mas ideias centrais da nossa historiografia. Em primeiro lugar, a dicotomia entre um sistema colonial – marcado por uma exploração mercantil sistemática dos recursos locais – e uma negação da natureza predatória da política mercantil lusitana que, justamente, ao se apoiar no caráter agrário-mercantil de um império pluricontinental, ensejou grande crescimento das áreas adjacentes (ou periféricas) desse mesmo império. Essa primeira visão (a do sistema colonial) tem ainda amplo consenso dentro das Ciências Sociais, assumindo o papel de principal vertente explicativa de nosso atraso estrutural. Seus autores de maior projeção, como já é sobejamente conhecido, foram Caio Prado Júnior e Celso Furtado, que, nas décadas de 1940 e 1950, escreveram grandes ensaios interpretativos que serviram de base teórica para as formulações industrializantes e nacionalistas exaradas dos estudos cepalinos (Prado Júnior, 1948; Furtado, 1963). 1 Uma segunda visão foi sintetizada nas últimas duas décadas a partir dos estudos de João Luís Ribeiro Fragoso e Manolo Florentino. Apesar da originalidade da pesquisa empírica, esses estudos operarama partir de dados e pesquisas anteriores, que já apontavam rachaduras no modelo explicativo proposto. 2 Embora articulassem uma interpretação global, esta ainda é marcada pelo signo do atraso ou do arcaísmo acerca dos limites da sociedade e da economia luso-americanas, a partir do século XVIII, e as consequências para o nosso desenvolvimento subsequente (Fragoso; Florentino, 1996; Fragoso, 2002). Outra controvérsia em relação à inserção do Brasil nos quadros gerais de uma economia-mundo coloca a natureza da dinâmica econômica, para o crítico, num período que vai, pelo menos, de 1780 até 1808. Nesse sentido, temos no mínimo três visões. A que podemos considerar novamente clássica , a partir da obra de Celso Furtado, que entende esse período como caracterizado por uma grave crise econômica, dada pela concorrência crescente do açúcar antilhano, somada à decadente extração aurífera e à ausência de um produto forte , como será o café ao longo do século XIX. Se, do ponto de vista empírico, a concepção de crise do sistema colonial, como proposta por Furtado, já foi diversas vezes posta em xeque, a importância do livroBrasil e Portugal na crise do antigo sistema colonial , de 1978, de Fernando Novais, foi relativizar o conceito de crise, relacionando-o ao processo de independência política do país Novais, 1983). 1 Sobre o alcance dessas ideias na definição dos modelos explicativos brasileiros, cf. Bielschowky (1995). 2 Notadamente aquelas feitas pelos autores que propuseram omodo de produção escravista colonial .

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