A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

78 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica balho assalariado viam a escravidão como uma relação pré-capitalista ou não-capitalista; os que enfatizavam a produção para o mercado mundial como o fundamento comum do capital tratavam a escravidão como capitalista, mas eram incapazes de explicar a especificidade das relações de produção escravistas (Tomich, 2011, p. 54). A saída oferecida por Tomich, muito próxima à letra de Philip McMichael (1991) criticada por Salles na nota 18 de seu ensaio, propõe a elaboração teórica da produção como uma relação histórica substantiva, que necessariamente pressupõe e inclui em sua conceituação a distribuição, a circulação e o consumo. Mercado mundial e divisão internacional do trabalho deixam dessa forma de ser tratados como entidades estanques e autônomas, sendo vistos antes como totalidades abertas em relação de interdependência mútua permanente, “como momentos de um processo contínuo de produção e reprodução social em escala mundial”. Essa acepção permite evitar a rigidez e o esquematismo contidos na teorizaçãodo sistema-mundo de Wallerstein, ao mesmo tempo em que explora toda a potencialidade heurística da perspectiva do sistema-mundo. O desenho da economia-mundo que daí emerge não a entende como a simples soma de suas partes ou como uma abstração que paira acima delas e as sobredetermina, mas como relações distintas entre formas sociais particulares e processos de produção materiais, integrados uns aos outros mediante modos definitivos de troca e poder político – como uma totalidade estruturada e diferenciada que muda ao longo do tempo. Inversamente, a totalidade das relações como um todo define o trabalho. Formas específicas de produção de mercadorias presumem relações de troca e são constituídas através delas numa divisão de trabalho distinta. Cada uma dessas formas de trabalho está sujeita a determinações e mediações múltiplas, complexas. (Tomich, 2011, p. 72-73) A proposta permite dar conta da própria historicidade do trabalho assalariado. Em determinado momento, como o do longo século XIX, ele foi de fato determinante na configuração da “totalidade estruturada” da economia-mundo capitalista, no que McMichael (1991) chama de “relação assalariada global”. Contudo, em momentos precedentes da dinâmica da economia-mundo capitalista, não. Nessa leitura da perspectiva do sistema-mundo, estamos longe da teorizaçãomecânica – e anistórica,

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