A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

61 Unidades de análise, jogos de escalas e a historiografia da escravidão no capitalismo Em parte inspirado por Brenner, Robin Blackburn avança na discussão ao observar como as transformações no campo inglês tiveram implicações do outro lado do Atlântico. A escravidão do Novo Mundo, especialmente com a construção dos sistemas coloniais do noroeste europeu, a partir de meados do século XVII, aparece como uma consequência nefasta da expansão do capitalismo na Europa. O autor se distancia do modelo de Brenner ao recuperar a primeira parte do argumento de Williams, oferecendo uma análise de como a escravidão no Novo Mundo contribuiu para o desenvolvimento europeu (Blackburn, 2003, p. 619706). A escravidão, ainda assim, é concebida como um elemento externo ao capitalismo. “As plantations escravistas”, argumenta Blackburn, “eram mais a consequência do que a causa do capitalismo” (Blackburn, 2016, p. 40). Em outros momentos, o autor fala de um “capitalismo escravista”, conceito usado para descrever o comportamento empresarial de senhores de escravos na segunda escravidão. Para usar os termos de Tomich (inspirado por Maria Sylvia de Carvalho Franco), capitalismo e escravidão parecem estar mais próximos de uma “dualidade integrada”, na narrativa de Blackburn, do que de uma “unidade contraditória”. O problema da unidade de análise volta à tona: espaços nacionais são concebidos como capitalistas ou não com base nas relações sociais de produção. Senhores de escravos, portanto, poderiam ter mentalidade moderna ou arcaica, mas, nos dois casos, o contexto no qual estavam inseridos era não capitalista. Uma incorporação do conceito de segunda escravidão nesses termos acaba por excluir o que considero um de seus elementos mais importantes, evidentemente herdado da abordagem de sistemas-mundo, qual seja: a compreensão do capitalismo como um sistema que transcende (mas não prescinde de) fronteiras políticas em sua combinação de múltiplas formas de trabalho. Sistemas-mundo Um dos fundamentos básicos da abordagem de sistemas-mundo consiste no questionamento do Estado-Nação enquanto unidade de análise, além de outras heranças do século XIX nas Ciências Sociais, incluindo as definições clássicas de capitalismo que o associam ao livre mercado. A caracterização geral de Wallerstein do capitalismo, como um sistema histórico no qual o capital “passou a ser usado (investido) de maneira especial, tendo como objetivo, ou intenção primordial, a auto-expansão (sic)”, é acompanhada de uma discussão, esta sim mais polêmica,

RkJQdWJsaXNoZXIy MjEzNzYz