A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

62 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica dos mecanismos fundamentais de acumulação do sistema (Wallerstein, 2001, p. 13). Wallerstein se distancia de outras formulações na medida em que não elege a relação entre capital e trabalho assalariado como motor único de tal processo. Em sua interpretação, o capitalismo, enquanto sistema histórico (e um ponto-chave da abordagem é a utilização do conceito de sistema histórico no lugar de sociedade ), é formado pela interdependência de uma economia-mundo – que, constituída por uma divisão internacional do trabalho, transcende espaços nacionais – e um sistema interestatal que garante a existência dessa economia-mundo e dela depende para existir (Wallerstein, 2006). A economia capitalista mundial passou, nas palavras de Giovanni Arrighi, “de um sistema em que as redes de acumulação estavam inteiramente inseridas nas redes de poder e subordinadas a elas para um sistema em que as redes de poder estão inteiramente inseridas nas redes de acumulação e subordinadas a estas” (Arrighi, 2006, p. 88). As redes de acumulação, que tornaram possível a auto expansão do capital, foram não apenas indiferentes às formas de trabalho que dominaram, mas exploraram combinações dessas múltiplas formas em diferentes escalas e de modo cambiante ao longo do tempo. Sistemas-mundo e a segunda escravidão Historiadores, sociólogos e antropólogos dialogaram criticamente com a obra de Immanuel Wallerstein ao longo dos anos 1970 e 80, levantando pontos muito próximos dos que embalaram alguns ramos da historiografia no mesmo período, como a Micro-História. Em seus diversos estudos sobre campesinatos caribenhos, Sidney Mintz e Michel-Rolph Trouillot, por exemplo, propuseram questões importantes sobre as dinâmicas das periferias no sistema mundial. Em comentários inspirados pela obra de Wallerstein, Mintz frisava a importância dos laços entre o consumo europeu de mercadorias tropicais produzidas por escravos africanos do outro lado do Atlântico, bem como, inversamente, dos fluxos de manufaturados europeus para as plantations caribenhas, antecipando temas que exploraria a fundo posteriormente (Mintz, 1977, p. 264; Mintz, 1985). Trouillot, por sua vez, em um artigo clássico de 1982, dedicado à rápida expansão da produção de café pelo setor de negros livres de Saint Domingue e suas implicações para a Revolução Haitiana, defendeu ser necessário ir além não apenas de abordagens sistêmicas, que faziam tímidos acenos às iniciativas e reações locais, mas, também, de estudos microssociológicos que omitiam “aquele que talvez fosse o evento mais

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