A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

60 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica abordagem toma fronteiras nacionais ou proto-nacionais como unidade de análise e coloca a História da Inglaterra (ou, em algumas variações, da Holanda) no centro. Os trabalhos de Robert Brenner e Ellen Wood (Aston; Philpin, 1985; Wood, 2001) são possivelmente os mais conhecidos do público brasileiro por essa abordagem, frequentemente mobilizados por historiadores para afirmar a natureza não capitalista da América Portuguesa ou do Brasil Imperial, em combinação com conclusões tradicionais da História Econômica, como a de O’Brien de 1982 (Fragoso, 2014, p. 16-18). Dentre os que buscam uma conexão entre capitalismo e colonialismo, o recurso à ideia de capitalismo comercial é uma das principais estratégias de análise (Novais, 1979). O próprio Marx, em sua famosa seção sobre a “assim chamada acumulação primitiva”, dava espaço para as duas interpretações, descrevendo tanto o processo de transformação do campo inglês quanto a exploração de indígenas nas minas do Novo Mundo, o comércio de africanos escravizados e as ações nas Índias Orientais como partes constitutivas de um mesmo processo histórico. “Os diferentes momentos da acumulação primitiva”, argumentava, “repartem-se, agora, numa sequência mais ou menos cronológica, principalmente entre Espanha, Portugal, Holanda, França e Inglaterra” (Marx, 2013, p. 821). Perry Anderson foi preciso em seu diagnóstico dos problemas que permeiam histórias excessivamente centradas no surgimento do capitalismo agrário na Inglaterra: “A ideia de capitalismo num só país, tomada literalmente, não é mais plausível que seu equivalente socialista”. Anderson faz referência às passagens do O Capital de Marx em que o autor aponta para uma trajetória cumulativa do capital, que envolve cidades italianas, Flandres, Países Baixos, impérios ibéricos, portos franceses, culminando com uma combinação sistêmica na Inglaterra de fins do século XVII. “Historicamente”, conclui Anderson, “faz mais sentido enxergar a ascensão do capitalismo assim: como um processo de agregação de valor que ganhou complexidade à medida que se deslocava por uma cadeia de lugares relacionados entre si” (Anderson, 2012, p. 287). Além disso, o foco excessivo nos desenvolvimentos internos da Inglaterra abre pouco espaço para se compreender o lugar da escravidão, ou mesmo do colonialismo, nessa história. Geralmente, em análises do chamadomarxismo político , a escravidão aparece como parte de comparações entre sistemas de trabalho, arrolada com outras formas de extração classificadas como pré-capitalistas. Estudos nessa tradição que se aventuram em sociedades escravistas, como os Estados Unidos, exploram mais os contrastes entre capitalismo e escravidão – tratados como unidades isoladas uma da outra – do que suas possíveis conexões (Post, 2011).

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