A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

55 Unidades de análise, jogos de escalas e a historiografia da escravidão no capitalismo dos; o poder estatal não é absoluto; planos nunca são totalmente implementados; discursos e práticas nem sempre estão alinhados; ações com frequência têm consequências imprevistas; atores nem sempre sabem o que estão fazendo; fenômenos e processos históricos são frequentemente contraditórios (Wilder, 2012, p. 730). Se estendermos essa análise para os estudos sobre escravidão, poderíamos incluir as inúmeras conclusões em torno do uso do sistema judiciário por escravos para avançar seus interesses ou da ausência de uma mentalidade capitalista entre senhores de escravos. Os avanços produzidos pela pesquisa exaustiva em arquivos espalhados pelo mundo são inegáveis, com a História Social da Escravidão produzindo inúmeras obras clássicas sobre o tema. Ainda assim, a discussão acima aponta para alguns dos limites de abordagens excessivamente calcadas no trabalho com fontes primárias. “O empiricismo descritivo”, argumenta Wilder, “é mascarado como insight teórico” (2012, p. 730). Uma das principais consequências desse processo foi que temas que não podiam ser facilmente abordados a partir do trabalho de arquivo, como o capitalismo mundial, foram sendo escanteados. Quando muito, recebiam um aceno em parágrafos introdutórios ou eram mobilizados para demonstrar sua inexistência na escala local (Marquese, 2013). Os debates gerados pela expansão daGlobal History e aNew History of Capitalismna academia anglo-americana têm apresentado o efeito salutar de reabrir os debates sobre capitalismo e escravidão, anteriormente dados como superados. “Conforme o capitalismo se expandiu do mercado mundial que criou”, Seth Rockman e Sven Beckert argumentam na introdução, claramente inspirada em Williams, de Slavery’s Capitalism , “a escravidão veio a ter um papel central, até mesmo decisivo – primeiro no Caribe e na América Latina, depois na América do Norte –, fortemente ligado à Revolução Industrial, que transformou o mundo, e à chamada Grande Divergência” (Beckert; Rockman, 2016, p. 3). Um número significativo de trabalhos explorando essas conexões foi publicado na última década (para uma síntese dessa bibliografia, ver Clegg, 2015). Ainda assim, parte das contribuições da New History of Capitalismpermanece excessivamente centrada na trajetória anglo-americana (Marques, 2017). As discussões relacionadas ao conceito de segunda escravidão têm colaborado não apenas para recolocar o debate sobre as relações entre capitalismo e escravidão na ordem do dia, mas, também, para questionar o nacionalismo metodológico que ainda informa uma parcela importante

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