A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

37 A segunda escravidão e o debate sobre a relação entre capitalismo e escravidão. Ensaio de historiografia ráter capitalista, quer dizer, racional, voltado para o mercado, lucrativo, altamente rentável e tecnológico, da escravidão sulista (Fogel; Engerman, 1995 [1974]). Outros contestaram ainda que a escravidão sulista estivesse ancorada em uma sociedade de natureza pré-capitalista, patriarcal e paternalista, como queria Genovese (Oakes, 1998 [1982]). O capitalismo da escravidão O debate sobre capitalismo e escravidão atingiu seu auge exatamente nos anos de 1980, ao final dos quais, lembremos, Dale Tomich forjou a noção de segunda escravidão. 10 Em seguida, a discussão hibernou, sufocada por sucessivas viradas que dominaram as historiografias norte-americana e atlântica da escravidão moderna nas últimas décadas: virada cultural, micro-histórica, narrativa e da agência, especialmente da agência escrava. Hoje, ao que parece, numa nova virada , a da História Global, a questão é retomada, ainda que se querendo nova em folha. Essa nova interpretação historiográfica é expressa no volume coletivo organizado por Sven Beckert e Seth Rockman, intitulado Capitalismo da escravidão , e sintetizada na introdução por eles redigida, que sumarizo e comento a seguir (Beckert; Rockman 2016, p. 1-27). De acordo com essa perspectiva, a economia escravista do Sul teria desempenhado um papel crucial no deslanche do desenvolvimento capitalista estadunidense. Reconhecer esse fato desafiaria um dos mitos mais persistentes na história americana, que vê a escravidão como uma instituição meramente regional, certamente indispensável para a compreensão do Sul, mas de importância insignificante para a nação como um todo (Beckert; Rockman, 2016, p. 6). A plantation e a fábrica compunham uma mesma e coerente economia nacional, avaliação que, segundo esses autores, era menos controversa, há 175 anos, do que é hoje. O capitalismo estadunidense não teria decolado superando a escravidão, um obstáculo a seu desenvolvimento, como na versão até então predominante, mas teve, na escravidão, a raiz de sua pujança. Esta centralidade da escravidão na economia nacional pode ser demonstrada por alguns fatos: até 1860, o algodão foi o principal produto de exportação do país; o capital representado pelo estoque de escravos era maior do que aquele representado por todas as ferrovias e fábricas norte-americanas; capitais estrangeiros garantiam a expansão territorial das plantationspela Luisiana e pelo Mississipi; a maior concentração de energia 10 Para um sumário do debate, ver Smith (1998).

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