A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

177 A inserção dos ingleses no império português: o caso da família Gulston no Rio de Janeiro, c.1710-c.1720 sob hegemonia espanhola (Boxer, 1969b; Almeida, 1993; Puga, 2009; Novais, 1995), foi com o Tratado de Paz e Aliança de 1654, celebrado entre os reinos de Portugal e da Inglaterra, essa última ainda sob o governo do protetorado de Cromwell, que formalmente tivemos a abertura do mercado imperial português para o comércio direto com os negociantes ingleses. Com esse tratado, 2 que só pode ser compreendido dentro da conjuntura da Restauração Portuguesa (1640) e da diplomacia e da política europeias pós-Guerra dos 30 anos, 3 os negociantes ingleses passaram a atuar formalmente no fretamento de navios no Império Português, ou seja, participaram diretamente do comércio das frotas. Além disto, face à pressão política inglesa, foi criado o cargo de juiz conservador em Lisboa e no Porto para tratar das questões judiciais envolvendo os súditos ingleses (Shaw, 1998, p. 65-66; p. 114-116). Em 1661, a Coroa Portuguesa celebrou novo tratado com os ingleses, que, como enfatizou Evaldo Cabral de Mello, por pouco não emperrou o Tratado de Haia, que firmou a paz entre Portugal e as Províncias Unidas (Mello, 1998, p. 227-253). O Tratado de 1661 não só vinculou a Coroa Portuguesa à Coroa Inglesa, com a realização do casamento de Catarina de Bragança com Carlos II, como rendeu à Inglaterra um dote de dois milhões de coroas portuguesas (cruzados), só definitivamente pago em 1684, além de Tanger, no Norte da África, e Bombaim, na Ásia, essa última de fato em 1665. O tratado estabeleceu também a tolerância religiosa e a reafirmação da participação dos negociantes ingleses no comércio direto no Império Português. Num artigo secreto, os ingleses se comprometiam a defender Portugal, caso houvesse um ataque das Províncias Unidas por terra e mar (Mello, 1998; Shaw, 1998, p. 15-16; p. 210-211). Entretanto, no referido Tratado, mais especificamente nos artigos 12 e 13, quatro famílias inglesas tiveram permissão para se fixarem com privilégios e imunidades “em Goa, Cochim e Dio (Artigo 12) e Bahia de todos os Santos, Rio de Janeiro e Pernambuco, tão bem quanto todos os outros dos domínios portugueses nas Índias Ocidentais” (Artigo 13) (Shaw, 1998, p. 15). A respeito desses ingleses no Estado do Brasil, Boxer destacou o relato do aventureiro, Capitão William Dampier, na Bahia, em 1699, que, 2 Ratificado em 1656, quando a armada de Robert Blake “exigiu ratificação, sob a ameaça de novo bloqueio em Lisboa”, como também de “captura o comboio da Cia Geral do Brasil (Mello, 1988, p. 182). A respeito da criação da Cia. Geral do Brasil”. cf. (Costa, 2002) . 3 Significa uma relação com o fim da Guerra Anglo-Holandesa e a capitulação holandesa de Recife, de maio de 1654.

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