A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

152 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica tores escravistas, que Parron define como uma conjuntura do mercado integrado mundial de commodities da periferia. A escravidão tendeu a se concentrar geograficamente nas fronteiras dinâmicas do algodão (Estados Unidos), café (Brasil) e açúcar (Cuba), e socialmente entre os grandes fazendeiros que podiam enfrentar a queda dos preços e o acirramento da competição por meio do incremento da produtividade e da ampliação da escala de seus empreendimentos (Parron, 2015, p. 22-23; 213-221). A evolução da escravidão em Cuba expressa a mudança de maneira cristalina. Entre 1831 e 1860, pouco menos de 370 mil africanos escravizados desembarcaram na ilha, uma média de 12,2 mil por ano, praticamente igual à dos vinte anos precedentes. Contudo, era cada vez mais provável que os recém-chegados fossem enviados para trabalhar nos engenhos. No ocidente cubano, a região mais rica e populosa, havia intensa competição por terra e mão de obra entre os produtores de açúcar e café. Ao longo das décadas de 1830 e 1840, o café cubano entrou em declínio, muito em função do sucesso dos fazendeiros do Vale do Paraíba que avançaram sobre o mercado norte-americano e passaram a influenciar os preços mundiais do artigo. Pesados investimentos na malha ferroviária e na mecanização dos engenhos ampliaram a rentabilidade e a vantagem comparativa do açúcar. Por fim, os furacões que atingiram a ilha em meados da década de 1840 devastaram os cafezais. O resultado foi uma massiva drenagem de recursos (escravos, terras e capitais) para o setor açucareiro, em detrimento de outras atividades produtivas (particularmente o café) e de proprietários que não tinham condições de arcar com os investimentos necessários para ampliar a escala de suas operações (Tomich, 2011, p. 106-115; Marquese; Tomich, 2015; Funes; Tomich, 2009). A evolução das exportações cubanas reforça o quadro. Em 1837, o açúcar representava 48% de seu valor, participação que beirou os 80% na década de 1860 (García; Santamaría, 2006). Se antes os escravos estavam distribuídos por diversos setores da economia, no início da década de 1860 47% trabalhavam nas unidades açucareiras. Pouco mais de 20% viviam nas cidades. O restante estava disperso na criação de gado, cultivo de alimentos, café e tabaco (Scott, 2000, p. 10-12). A escravidão acompanhou a geografia da expansão açucareira. Em 1862, 70% da população escrava residia nas províncias de Havana, Matanzas e Santa Clara, as principais produtoras do artigo (Bergad; Fe Iglesias; García, 1995, p. 32-33). A posse de escravos se concentrou entre os grandes proprietários. A mecanização dos engenhos e a instalação da malha ferroviária permitiram a expansão de suas plantas produtivas, com

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