A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

122 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica tos. O aumento progressivo do cultivo do café na tríplice fronteira entre as três províncias implicou a manutenção de uma numerosa população escrava, mesmo depois do fim do tráfico, notadamente em Campos dos Goytacazes (1850), com 37.747 escravos; Zona da Mata mineira (Ubá, Rio Pomba e Mar de Espanha – 1854), com 23.397 escravos; e Espírito Santo (1856), com 12.269 escravos. 1A simbiose entre açúcar e café, condicionados ao trabalho escravo, produziu um cenário de transformações em Campos dos Goytacazes, durante a segunda metade do século XIX, com a instalação de ferrovias, indústrias, bancos, canais, engenhos a vapor, instalações portuárias, companhias seguradoras, empresas de navegação, infraestrutura urbana, serviços públicos, dentre outras. Portanto, a imbricação entre escravidão e capitalismo em escala local expressa um microcosmo do significado de segunda escravidão, pelo concerto entre a produção escravista, que mantém na região certa estabilidade no curso da segunda metade do século XIX, e variáveis do desenvolvimento capitalista, como a incorporação de inovações evidentes em áreas centrais do capitalismo internacional, como máquinas e embarcações a vapor, equipamentos e material rodante para a montagem de ferrovias, além da renovação de insumos industriais, urbanos e rurais, ainda que esses mecanismos mais sofisticados fossem produzidos em países de industrialização avançada. Entretanto, pode-se constatar a produção de alguns bens manufaturados em escala local e regional. Mesmo que o conceito de segunda escravidão se associe à produção de uma commodity específica, em uma determinada sociedade escravista, não se deve desprezar uma escala produtiva múltipla, como no caso aqui evidenciado, e sua inserção dentro do conjunto global do mercado capitalista, nos quadros da Revolução Industrial, da hegemonia britânica e da reprodução do próprio capitalismo (Muaze; Salles, 2014, p. 11-18). Em que pese o café se tornasse o produto de maior impacto no cenário regional, a importância das demais atividades produtivas não deve ser diminuída, especialmente a do açúcar e demais produtos. Há evidências de que, desde sua ocupação no século XVIII, Campos dos Goytacazes possuía uma dimensão regional que ultrapassava os limites da Capitania de São Tomé ou mesmo da Capitania da Paraíba do Sul. Marcio Soares (2016), ao analisar a sua ocupação e a disputa por suas terras, fronteira aberta para as atividades agrárias e missionárias, indica que a vastidão dos campos já atraía gente do Espírito Santo e de outras 1 Para Campos dos Goytacazes, ver quadro 1; para a área delimitada como Zona da Mata de Minas Gerais, ver Carrara, (1993, capítulo II, quadro 7); para a Província do Espírito Santo, ver Almada, (1984, p. 68-69).

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