Os desafios jurídico-ambientais do uso de agrotóxicos

164 (Ir)responsabilidade organizada na liberação de agrotóxicos no Brasil tróficos, imprevisíveis, e com possibilidades de atingir indefinidamente o número de vítimas no médio e longo prazo. É o que Beck (2010, p. 73-79) chama de “miopia econômica” em que o olhar “está dirigido às vantagens produtivas” imediatas e de “cegueira” deliberada em relação aos riscos provocados pelo sistema político e econômico em um “caminho de envenenamento de longo prazo do ser humano e da natureza”. Neste caso, a conscientização da ameaça pode desembocar no seu inverso que é a negação movida pelo medo. Aqui Beck, (2010, p. 91-92) percebe que a distribuição de riqueza e risco se diferenciam e se entrecruzam e que a ampliação da produção de alimentos “não pode ser saciada por meio da negação” dos riscos à saúde humana e ao meio ambiente. Sempre há boas razões para negar os riscos e recorrer “a possibilidades de desvios interpretativos das incertezas e temores provocados”. Por isso, os alertas de Beck deveriam ser observados nesse momento político brasileiro de liberação de agrotóxicos. Para Beck (2010, p. 92), na sociedade de risco: [...] justamente com a ampliação dos perigos e a simultânea inércia política, tendência imanente à “sociedade de bode expiatório”: subitamente deixam de ser as ameaças e passam a ser aqueles que as revelam os que provocam a inquietação generalizada. [...] É justamente a inabarcabilidade e o desamparo diante das ameaças que, com sua ampliação, favorecem reações e correntes políticas radicais e fanáticas, que transformam os estereótipos sociais e os grupos por eles atingidos em verdadeiros “para-raios” para as ameaças que se mantêm invisíveis, inacessíveis à ação (BECK, 2010, p. 92). Entretanto, “aquilo que por um lado gera efeitos gera por outro doenças” e efeitos colaterais “têm voz, olhos, rosto e lágrimas” (BECK, 2010, p. 74). A humanidade involuntariamente “participa como cobaia, sobre os efeitos de intoxicação que se acumulam emmeio a ela, com o ônus da prova invertido e bastante dificultado” (BECK, 2010, p. 84). Pignati et al. (2017, p. 3283-3287) elaboraram uma metodologia em que espacializaram o “consumo de agrotóxicos nos municípios brasileiros” e correlacionaram com dados do Departamento de Informática do SUS (DATASUS) do Mi-

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