A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

48 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica Esse foi, resumidamente, o que considero ser o traço distintivo mais importante da segunda escravidão enquanto estrutura histórica específica: fundamentar a formação de blocos históricos singulares, escravistas ou dominantemente escravistas. Esses blocos históricos inseriram-se e, ao mesmo tempo, estiveram inseridos, como uma de suas vertentes formadoras, em uma ordem mundial de livre comércio dominantemente capitalista, que perdurou durante os três primeiros quartos do século XIX. A “marca” escravista dessas formações históricas se deu de três formas derivadas de uma morfologia comum, apresentando, ao mesmo tempo, desenvolvimentos empíricos semelhantes e distintos. Essa marca foi nacional, integral, mas não exclusiva, como no Império do Brasil e nos efêmeros Estados Confederados da América, entre 1861 e 1865; híbrida, como nos Estados Unidos, até 1860; e colonial, no caso de Cuba e de seu lugar na configuração do Segundo Império Espanhol. 19 Para concluir, uma última palavra sobre o que pode vir a ser um importante campo de investigações e debates em torno do desenvolvimento do conceito de segunda escravidão como uma estrutura histórica específica. Em texto pioneiro, de 2013, Rafael Marquese identificou as conexões mercantis e, em menor grau, financeiras entre a economia escravista cafeeira do Império do Brasil e a economia escravista do Sul dos Estados Unidos, que se constituiria “no coração da estrutura histórica da Segunda Escravidão” (Marquese, 2013b, p. 51). Tais conexões se estenderiam igualmente à esfera política com a defesa comum da escravidão no plano internacional (Marquese; Parron, 2011). Segundo Marquese, apesar de sua crítica a Wallerstein, a ideia de segunda escravidão de Dale Tomich parte do mesmo campo teórico e metodológico aberto pela perspectiva do sistema-mundo. Tal entendimento do capitalismo histórico não veria “as relações entre trabalho escravo e trabalho assalariado como externas umas às outras, porém estrutural e dialeticamente integradas”. Desse modo, “as forças estruturais do capitalismo global que moldaram a escravidão negra oitocentista nas Américas” deveriam estar no primeiro plano da análise (Marquese, 2013b, p. 52). A perspectiva aqui defendida difere dessa concepção. Ela vê a segunda escravidão enquanto uma estrutura histórica específica, abransegunda escravidão, tais sujeitos históricos cristalizaram-se em classes dominantes regionais e nacionais, constituindo-se como forças subjacentes a Estados nacionais, como aconteceu no Império do Brasil e dos efêmeros, mas poderosos, Estados Confederados da América. 19 Para a caracterização da república americana como uma república escravista, até 1860, ver: Fehrenbacher (2002) e Van Cleve (2010). Para Cuba, ver Schmidt-Nowara (1999) e, para o Brasil, Salles (2008).

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