A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

156 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica tossuficientes. Minas Gerais, por exemplo, contava com um pujante setor de derivados de cana que empregava milhares de escravos (Godoy, 2008). As características da planta produtiva dos dois artigos também eram distintas. Por mais que os pés de café tivessem caráter de bens de capital, os investimentos iniciais eram relativamente baixos e a cultura era itinerante (Marquese, 2013). Os engenhos de açúcar, pelo contrário, exigiam altos investimentos na aquisição de equipamentos e terras. Isso diminuía a flexibilidade da empresa açucareira, de modo que os senhores de engenho demoravam a responder às oscilações do mercado e preferiam operar em prejuízo a abandonar a atividade (Schwartz, 1988, p. 177-206). A diferença é bem explicada por Felipe Alfonso em seu estudo sobre Campinas na primeira metade do século XIX. O custo elevado de construção e manutenção da indústria açucareira desestimulava a transição rápida para o café. Nas propriedades também se cultivavam alimentos que eram comercializados nos mercados locais e ofereciam retorno em períodos de declínio dos preços do açúcar. A partir da década de 1830, os proprietários campineiros passaram progressivamente a diversificar seus investimentos e a introduzir o café, mas o açúcar dominou o setor agroexportador do município até 1850 (Alfonso, 2018, p. 95-147). Se isso ocorria em áreas onde havia competição por capital e trabalho entre os dois setores, no Nordeste, onde a produção escravista de açúcar estava plenamente enraizada desde o século XVII, é natural que se apostasse na atividade até o limite. Na Bahia, cujas exportações de açúcar estagnaram na segunda metade do século XIX, os senhores de engenho mais ricos do Recôncavo conseguiram manter grandes escravarias depois da interrupção do tráfico transatlântico. Foi somente na década de 1870 que eles passaram a investir preferencialmente em outros cultivos como o fumo, o café e a mandioca (Barickman, 1996). Ainda assim, quando o tráfico interprovincial drenava milhares de escravos do Nordeste para o Sudeste, não eram os municípios açucareiros os que mais perdiam cativos, mas sim as cidades e zonas agrárias do interior. As províncias açucareiras (Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas) tampouco foram as mais atingidas no auge do tráfico interprovincial. A maior parte dos escravos do Nordeste que rumavam para o Sudeste vinham do Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e Piauí, províncias que haviam desenvolvido um setor exportador de algodão na década de 1860 (Slenes, 2004, p. 333-344; Motta, 2006). A tenacidade do açúcar e das atividades produtivas orientadas ao abastecimento impediu que a escravidão se concentrasse de forma avassaladora na economia cafeeira. Houve, efetivamente, uma mudança

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