A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

13 APRESENTAÇÃO Dale Tomich1 A segunda escravidão é um conceito aberto que tem o objetivo de repensar a relação entre capitalismo e escravidão e as causas para a destruição desta última no oitocentos. A ideia nasceu de minha insatisfação com histórias lineares da escravidão que a veem, de alguma forma, como incompatível com o capitalismo industrial e as ideias liberais de propriedade e liberdade. Minha percepção inicial derivou da comparação do desenvolvimento da escravidão de plantation na Martinica e em Cuba ao longo do século XIX. As evidências não se ajustavam à visão linear sobre o capitalismo e a escravidão. O desenvolvimento do capitalismo industrial e do mercado mundial acentuaram rigidezes espaciais e sociais que levaram à crise da escravidão e do sistema deplantationna Martinica. Em Cuba, esses mesmos processos estimularam a expansão sem precedentes da produção açucareira e a reconfiguração da escravidão. Uma vez rompida essa visão linear de progresso e do tempo histórico, um novo modo de ver a relação capitalismo-escravidão emergiu, especialmente nas zonas centrais produtoras de commodities em Cuba, Sul dos Estados Unidos e Brasil (Tomich, 1994). A visão linear é, hoje, menos predominante, mas o problema de como interpretar a relação entre capitalismo e escravidão permanece. Tanto a Nova História Econômica quanto a Nova História do Capitalismo reconhecem o caráter capitalista da escravidão. A primeira assimila a escravidão à moldura abstrata e universal do mercado de trocas fornecida pela economia neoclássica onde tudo – e nada – é capitalista. A lucratividade e a produtividade são demonstradas nesse quadro, mas essa concepção, sem espaço e sem tempo, é indiferente à segunda escravidão. Ela preocupa-se apenas com o input marginal do trabalho e não distingue o trabalho escravo de outras formas de trabalho produtoras de mercadorias. Senhores e escravos respondem aos estímulos do mercado através de escolhas econômicas racionais. A relação senhor-escravo é deslocada 1 Fernand Braudel Center – Universidade de Binghampton.

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