A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

279 A SEGUNDA ESCRAVIDÃO: O RETORNO DE QUETZALCOATL? Waldomiro Lourenço da Silva Júnior Dale Tomich, o autor do conceito de segunda escravidão , em seu artigo A ordem do tempo histórico , defendeu o diálogo entre abordagens historiográficas diversas. Nomeadamente, referiu-se, de um lado, às que, afinadas à concepçãobraudelianade temporalidade plural, assumem uma escala macrocontextual (como é o caso da historiografia da segunda escravidão), e, de outro, a Micro-História, definida pela metáfora de uma análise microscópica, que toma o local ou o particular como ponto de partida e explora vivências individuais (Tomich, 2011, p. 38-51). Ao partir de um estudo intensivo da documentação, a microanálise evidencia relações e fenômenos particularizados no evento e de curto prazo – dimensão temporal depreciada e negligenciada pelo modelo original de Braudel –, que, de outra maneira, permaneceriam ocultos, encapsulados, esquecidos na noite dos tempos. Mas, ao invés de refutar a perspectiva do tempo plural, esse procedimento (ou experimento como preferem alguns) pode amplificar a sua complexidade, preenchendo a lacuna, testando os efeitos e as limitações dabig picture . Por outro lado, a Micro-História, ao dialogar com outras dimensões do tempo (longa duração e conjuntura), pode também adensar o seu campo de possibilidades, sustentando a variação de escalas e situando o local e o particular em movimentos históricos mais abrangentes, de maior duração, que ajudem a explicar dinâmicas econômicas, tradições, sistemas normativos e assim por diante. Este é, em linhas bem gerais, o argumento central de Tomich. Antes de refletir mais diretamente, seguindo esta linha, sobre a maneira como Micro-História e segunda escravidão poderiam efetivamente dialogar, ou melhor, compor um repertório analítico integrado com vistas a um melhor entendimento da escravidão no Brasil e no espaço atlântico ao longo do século XIX, gostaria de refletir brevemente sobre as reservas em relação ao conceito de segunda escravidão. A tarefa é peculiar, já que, até onde sei, ninguém formulou críticas consistentes em relação a essa concepção, por escrito, em algum estudo monográfico, livro ou artigo. Parece a alforria onerosa na longa

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